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Publicado em 10/02/2020

Pesquisadores explicam a relação entre baixa produtividade e impacto ambiental entre algodão transgênico/convencional e o orgânico.

Desde que lançou o movimento Sou de Algodão na São Paulo Fashion Week em outubro de 2016, a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) estabeleceu e vem ampliando o contato com um elo da cadeia produtiva que, embora seja a razão de todo o trabalho desenvolvido pela cotonicultura, até então, tinha pouca ou nenhuma familiaridade com o processo produtivo da fibra, o consumidor final. Desde a estruturação do movimento, ouvir o cliente final, conhecer seus perfis, hábitos de consumo, causas e, principalmente, suas dúvidas, tem sido o balizador das estratégias da Abrapa para esclarecer a população sobre a fibra, considerada uma das mais inclusivas e sustentáveis dentre todos os seus concorrentes, sejam naturais, artificiais ou sintéticos.


O Sou de Algodão foi criado para fomentar o consumo da matéria-prima no mercado interno, valorizando seus diferenciais como sustentabilidade – ambiental, social e econômica – versatilidade, respirabilidade, conforto, o fato de ser antialérgico, dentre outros aspectos. “Um dos equívocos mais comuns que notamos nas nossas conversas com este consumidor final é a confusão entre sustentabilidade e orgânicos, como se um e outro fossem necessariamente a mesma coisa”, diz o presidente da Abrapa, Milton Garbugio.


Equiparar os sentidos entre sustentabilidade e orgânicos é ainda mais complicado que tentar igualar bananas e laranjas, uma vez que orgânicos se referem a uma técnica de produção que não permite o uso de defensivos ou fertilizantes sintéticos (químicos) no processo, assim como de tecnologias como os transgênicos. Já a sustentabilidade é um conceito, baseado nos pilares ambiental, social e econômico, segundo o qual os recursos utilizados na produção têm de ser pensados de modo a atender à demanda presente e também à das futuras gerações, permitindo, inclusive, a longevidade da atividade produtiva.


“As duas palavras não apenas não têm o mesmo significado, como podem levar a conclusões opostas”, antecipa o engenheiro agrônomo, doutor em produção vegetal e chefe-geral da Embrapa Algodão, Liv Severino. Um dos exemplos, diz respeito à relação entre as altas produtividades e a área necessária para a produção. “Se a produtividade é alta, a produção por hectare será maior, e menos área de lavouras serão necessárias para atender à demanda de consumo. Isso significa mais impactos ambientais”, explica.


Fazendo as contas


O Brasil tem a maior produtividade em algodão do mundo, quando considerada a produção em sequeiro, que é a que não utiliza irrigação artificial. São, na média, 1,76 mil quilos de pluma (algodão beneficiado) por hectare. De acordo com diretor executivo do Instituto Mato-grossense do Algodão (IMAmt), Alvaro Salles, a média obtida nos projetos de agricultura familiar financiados pelo Fundo de Apoio à Cultura do Algodão (Facual), com a algodão orgânico no Mato Grosso, são de 684 quilos de pluma por hectare. Considerando o consumo de algodão da indústria têxtil no Brasil, que é de 700 mil toneladas, para atender a esta demanda com a atual produtividade das lavouras de algodão brasileiras, são necessários 398 mil hectares.


“Se fosse com agricultura orgânica, a gente teria que cultivar 1,03 milhão de hectares, o que causaria impacto ambiental muito maior”, afirma Liv Severino. Hoje, o Brasil não apenas atende completamente a necessidade da indústria têxtil em seu território, como exporta o excedente dos seus quase 3 milhões de toneladas de algodão, produzidos na safra 2018/2019, sendo o segundo maior exportador mundial de algodão, atrás apenas dos Estados Unidos.


Alvaro Salles destaca ainda um outro impacto negativo da agricultura orgânica. “Considerando que ela não pode usar transgênicos ou pesticidas para eliminar pragas, entre elas, a que devastou a cotonicultura brasileira nos anos de 1980, o bicudo do algodoeiro, o risco fitossanitário tornaria inviável a produção em larga escala”. Segundo Salles, o bicudo é um besouro que se alimenta principalmente dos botões florais do algodoeiro, e, por conta disso, derruba a produtividade das lavouras. Pelo modelo orgânico de produção, a única forma de combater o bicudo seria com inimigos naturais, que são poucos, e cata manual seguida de incineração dos botões infestados. “Isso demanda em média 5 pessoas por hectare. Numa fazenda de 100 hectares, seria 20 pessoas. Uma família sozinha não consegue dar conta desse contingente para manter o monitoramento constante”, argumenta.


Prospectando alternativas


Salles afirma que, no estado de Mato Grosso, o IMAmt tem buscado alternativas biológicas para combater pragas e doenças. “Estamos recolhendo amostras de solo, água, plantas e insetos atacados por microorganismos e levando estes materiais para os laboratórios, para isolamento e posterior estudo de viabilidade de utilização, como alternativa ao uso do controle químico”, revela. A partir dessa iniciativa, segundo o diretor do IMAmt, foram implantadas duas biofábricas, e uma outra está em início de construção, para fornecimento de produtos biológicos aos produtores.


Sobre os transgênicos, Liv Severino da Embrapa acrescenta que são tecnologias que usam princípios naturais, da genética, que reduzem a quantidade necessárias de produtos químicos nas lavouras. Os pesticidas, por sua vez, são seguros quando considerado o manejo e quantidades corretas. “Querer fazer agricultura sem pesticidas é como fazer medicina sem remédios, como antibióticos, anti-inflamatórios e anestesia. “Quem se submeteria a uma cirurgia sem isso?”, questiona. 


Fonte: Imprensa Abrapa